Pacientes com a Covid-19 ou com suspeita e acompanhantes, sem isolamento, aguardando leitos ao lado de corpos no Hospital de Emergência (HE), em Macapá. Esse é o cenário registrado nesta quarta-feira (6) por José Chaves, filho do taxista Manoel Geraldo Chaves, de 63 anos, diagnosticado com o novo coronavírus há três dias.
Segundo José Chaves, o pai foi internado no HE no sábado (2), com febre e dificuldade de respirar, e desde o resultado positivo para a Covid-19, ele aguarda transferência para um leito de Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) de um dos centros de atendimento exclusivo. O Amapá tem dois ativos.
O filho detalhou que ele e o pai, em dois dias na Enfermaria 2 do hospital, viram cinco pessoas morrerem no local e, segundo ele, todos porque não resistiram ao novo coronavírus. Ele reclamou que houve demora no recolhimento dos corpos.
"Novas vítimas faleceram ontem [terça-feira], por volta de 19h e só retiraram os corpos agora de manhã. Já tivemos contato com cinco corpos, mas os dois primeiros foram retirados logo. [Os profissionais de saúde] estão alegando que não tem leito, não tem vaga para o meu pai. Tá uma calamidade", desabafou.
Em uma das fotos tiradas na terça-feira (5), Manoel Geraldo aparece em uma maca ao lado de um corpo. José disse que o pai precisa de um leito com respirador mecânico para ajudar na recuperação dele, mas foi informado que há 37 pessoas na fila para transferência.
O G1 entrou em contato com a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) para saber da situação do hospital e do taxista, mas desde a manhã não obteve resposta. A pasta informou que deve encaminhar uma nota ainda nesta quarta-feira.
Em entrevista ao JAP1, por volta das 12h desta quarta-feira, o secretário de Saúde do Amapá, João Bittencourt - que foi infectado pelo novo coronavírus - declarou que o governo enfrenta dificuldades em conseguir abrir leitos de UTI por falta de alguns equipamentos.
Sobre a falta de isolamento dos pacientes no HE, o titular da Sesa afirmou que o hospital deve restringir os acompanhantes no local; e que prevê abrir em até dois dias o centro de triagem - que foi montado há quase duas semanas em frente ao hospital - para garantir o isolamento no pronto-socorro.
"O que nós temos que fazer é entrar em contato com as unidades hospitalares e ver uma forma da gente impedir esse trânsito principalmente de acompanhantes. Na frente do HE nós estamos finalizando uma estrutura de triagem. A gente espera logo, logo, dentro de um ou dois dias, que a gente possa concluir e passar essa demanda de Covid para dentro dessa estrutura de triagem", disse.
O Ministério da Saúde define que sejam instalados nas unidades de saúde "espaços de acolhimento e triagem que possibilite a identificação e o isolamento de pacientes suspeitos de Covid-19, antes ou imediatamente após a chegada ao estabelecimento de saúde".
No Hospital Estadual de Santana (HES), no dia 1º de maio, profissionais da saúde também registraram pacientes ao lado de outro que morreu com o novo vírus. O local também não tinha isolamento para os infectados ou com suspeita.
Bittencourt ressaltou que o governo busca equipar e abrir um espaço de isolamento já construído em frente ao HES - mas não tem previsão para funcionar. Além disso, o secretário disse que tem a intenção de criar isolamento no anexo do Pronto-Atendimento Infantil e que o governo aguarda resposta do Ministério da Defesa da montagem de um hospital de campanha.
O governo estadual alimenta uma página na internet chamada Painel Coronavírus com dados sobre o avanço do novo vírus e da doença no Amapá, inclusive sobre a disponibilidade de leitos nos Centros Covid 1 (que funciona no completo do Hospital de Clínicas Dr Alberto Lima, para atendimento intensivo) e o Covid 2 (na Maternidade Bem Nascer, com atendimentos clínicos), ambos em Macapá.
Até o início da tarde desta quarta-feira, o portal indicava que 8 dos 197 leitos clínicos em funcionamento e 16 dos 54 leitos de UTI ainda estavam disponíveis. A taxa de ocupação dos leitos clínicos era de quase 96% e dos de UTI, passava os 70%, segundo os dados da página. As informações são tanto de hospitais públicos quanto privados.
O titular da secretaria de Saúde também comentou sobre o problema que gera o cenário em que pacientes ficam ao lado de corpos no HE.
"Se o paciente faleceu de uma enfermidade que não é Covid-19, existe a retirada desse corpo inclusive com os próprios servidores de dentro da unidade hospitalar. Mas se por ventura ele falece de Covid-19, tem que entrar num protocolo de retirada, que segue um outro caminho que não é essa rapidez que a gente necessita. [...] Isso tudo está dentro do radar de solução e a gente espera logo, logo concluir essa situação e não deixar mais a gente passar por essa dificuldade", falou.
O secretário de Saúde voltou a reforçar a necessidade de seguir as orientações das organizações de saúde para contribuir para não provocar o colapso do sistema.
"Nada está parado. A gente está diante desse caos, as cobranças que nos fazem e a realidade que se apresenta nos impulsiona a tomar uma solução e apresentar para a sociedade. [?] Existe uma distância muito grande entre o que o poder público pode oferecer de retaguarda de tratamento e o que existe de aumento dessa curva. É uma diferença gigantesca, que a gente precisa conclamar à população para que se mantenha em casa no isolamento que o poder público está solicitando", acrescentou.
Fonte: G1